TREZE DE MAIO DE 1888


        
Durante todo o período da escravidão no Brasil, as relações entre senhores e escravos foram marcadas por enfrentamentos sangrentos. Dentre vários acontecimentos contra o sistema, os levantes, as rebeliões, as fugas os suicídios fizeram parte desse cenário durante mais de trezentos anos de escravidão. De um lado, os senhores proprietários de escravos usando de vários artifícios para o controle dos seus plantéis, e do outro, o escravo articulando várias formas para conseguir a tão sonhada liberdade.
O processo para o fim da escravidão foi feito gradativamente. Várias leis foram criadas durante o século XIX para chegar ao tão sonhado 13 de Maio de 1888. Em 1850, a Lei Eusébio de Queiroz, proibiu a vinda de escravos oriundos da África para o Brasil, com essa medida o preço do escravo sobe assustadoramente e agora o tráfico interprovincial de escravo é que vai suprir nas fazendas os plantéis de escravos. A Lei do Ventre Livre, de 28 de Setembro de 1871, libertou todos os cativos nascidos de pais escravos, outra dificuldade é que muitas vezes como aparece nos documentos, nem o senhor e nem o escravo sabiam ao certo sua idade. A Lei Saraiva Cotegipe ou Sexagenário, de 28 de Setembro de 1885, regulava gradualmente o fim da escravidão do elemento servil, ou seja, ficava liberto o escravo com mais de 65 anos. Ao analisarmos a lei do sexagenário seu efeito prático é discutível, porque um escravo com mais de 65 anos já não tinha o mesmo vigor e preço de mercado, sem contar que poucos chegavam a esta idade. Esse processo finaliza com a Lei Áurea de 1888, extinguindo a escravidão no Brasil.
É importante entender que apesar do processo pelo fim da escravidão ter sido controlado por uma elite branca e por políticos dominantes, não podemos deixar de ressaltar o papel dos escravos nessa luta. Muitos historiadores e memorialistas, incluindo os uberabenses, excluíram os negros do processo histórico e incutiram a visão do senhor proprietário, gerando uma visão distorcida da importância da luta do negro pela sua liberdade.

ASPECTOS ABOLICIONISTAS

A partir de 1880, os movimentos abolicionistas no Brasil cresceram assustadoramente. Cidadãos como José Bonifácio, Luis Gama, Antonio Bento, Silva Jardim, Rui Barbosa e outros se destacaram nesse período. Porém, os políticos Joaquim Nabuco e José do Patrocínio criaram no Rio de Janeiro, a Sociedade Brasileira Contra a Escravidão. Outras sociedades começaram a ser fundadas por este vasto território brasileiro. No Recife foi fundada por alunos da Faculdade de Direito, uma Associação Abolicionista e na cidade de São Paulo, fundaram a Sociedade Emancipadora de São Paulo. Em Minas Gerais, várias associações abolicionistas foram fundadas e divulgadas na década de 1880. No ano de 1883 “publicou-se um uniforme do Clube Abolicionista Mineiro Visconde do Rio Branco, cujo presidente convidava os sócios a comparecerem ao teatro ouropretano”1. Estas sementes se espalharam e germinaram por quase todo o território chegando até a Província de Uberaba.
A grande dificuldade para melhor compreensão desse período em Uberaba é a falta de fontes existentes relativas à campanha abolicionista e a abolição da escravidão no município.
Um dos acervos mais preciosos para tentar compreender a escravidão em Uberaba é o jornal Gazeta de Uberaba, fundado em 1º de Agosto de 1875, coleção particular que pertence ao Dr. Arnaldo Rosa Prata. 
Nas importantes obras acerca da história da cidade, autores como Antonio Borges Sampaio, Hildebrando Pontes, Gabriel Toti, José Mendonça e outros, não fazem nenhuma menção aos movimentos abolicionistas e a abolição em 13 de maio de 1888. Somente Sampaio em sua obra denominada História, Fatos e Homens, é que relatou sobre a criação da Sociedade Dramática Abolicionista, fundada em 24 de outubro de 1883. No dia 19 de Janeiro de 1884 no Teatro São Luís foi passada pela Sociedade Dramática Abolicionista, a primeira “Carta de Liberdade para a Escrava Rita”, que pertencia ao senhor Luís Antônio Guimarães Guaritá. Também foi criada a Sociedade Abolicionista Filhas do Calvário, em 27 de Abril de 1884.
Fica difícil compreender o processo abolicionista sem considerar as forças políticas nele atuante. Nesse período foram criadas várias associações, e jornais defendendo o fim da escravidão. Os movimentos abolicionistas presentes em várias regiões do Império, pelo seu caráter urbano, se desenvolveram com as mesmas características em Minas Gerais, assim como em todo o Brasil, principalmente nos últimos oito anos antes da abolição da escravidão.
Segundo Liana Reis, do Departamento de História da PUC – MG, aos vários municípios que surgiram neste período, houve também um aumento considerado de jornais produzidos por intelectuais da região, “particularmente eclesiásticos, profissionais liberais, homens públicos que tiveram posição de destaque na vida política mineira e nacional”. Em pesquisa feita no jornal Correio Católico de Uberaba, Hildebrando Pontes redigiu a história da Imprensa em Uberaba de 01 de outubro de 1874 a 28 de março de 1932, onde observou que foram criados 186 periódicos em 58 anos. No período de 29 de Fevereiro de 1880 a 19 de Maio de 1889, foram criados 23 jornais, tendo como proprietários, colaboradores e redatores, pessoas abastadas da sociedade uberabense, políticos e profissionais liberais de destaque. Nessa magnífica obra A Imprensa em Uberaba por Hildebrando Pontes, ele descreve a ideologia do jornal, isto é, se era noticioso, crítico, político, rural, ou religioso. Destes vinte e três jornais, embora alguns deteriorados, nenhum deles fala do “Movimento Abolicionista em Uberaba”.




ABOLICIONISTAS EM UBERABA (?)

No Brasil foram criadas várias associações abolicionistas e, em Uberaba, foi criada a Sociedade Dramática Abolicionista e a Sociedade Abolicionista Filhas do Calvário.
Em Uberaba, muitos se diziam abolicionistas, mas, na verdade, em sua essência, eram escravocratas. Muitas vezes, os discursos que permeavam os abolicionistas uberabenses não condiziam com suas atitudes. Um fato interessante a observar refere-se à instalação da Sociedade Abolicionista Filhas do Calvário em 1884, que teve como Presidente o Senhor Antônio Elói Cassimiro de Araujo, conhecido como Barão de Ponte Alta, casado com a filha do abastado Tenente Joaquim da Silva e Oliveira, irmão do Major Antônio Eustáquio da Silva e Oliveira, fundador de Uberaba, e do Capitão Domingos da Silva e Oliveira. O Barão herdou mais tarde as sesmarias de Bebedouro, Santo Inácio e Ponte Alta, um grande latifúndio, que se perdia na imensidão do horizonte.
Um exemplo que podemos citar é o processo criminal que envolve a escrava Maria Rita, no ano de 1886. A referida escrava era propriedade do Barão da Ponte Alta, primeiro Presidente da Sociedade Abolicionista Filhas do Calvário. Não se submetendo aos maus-tratos de seus senhores, a escrava foge da fazenda em Ponte Alta, com correntes presas aos seus pés, argolas no pescoço, carregando seu filho de dois anos. Ela se apresentou às autoridades policiais da época alegando ter sido castigada com vários açoites, que já eram proibidos desde a Constituição de 1824. Estes nada resolveram e ainda mandaram a escrava de volta para a fazenda do Barão, sendo novamente submetida a maus-tratos.
O Barão de Ponte Alta pertencia a uma Sociedade Abolicionista, mas, ele era realmente um abolicionista?

13 DE MAIO DE 1888

            A festança atravessava dia e noite, mesmo debaixo de muita chuva. As grandes capitais do litoral e, adentrando o interior, até a cidade de Ouro Preto, nas Minas Gerais ficaram paralisadas pela grande festa no dia 13 de maio. De acordo com Eduardo Silva da “Fundação Casa de Rui Barbosa”, “parou o porto do Rio, os trens de carga, as repartições públicas, os serviços dos correios, os bancos, as escolas públicas e particulares”2. As festividades comemorativas da Abolição tomaram conta da Capital do Império no Rio de Janeiro. As festas duraram uma semana. Foram distribuídos panfletos e poesias para o povo. As comemorações tiveram seu final com a concorrida procissão cívica no dia 20 de Maio. Esta euforia não ficou limitada apenas a Corte, estava acontecendo em diversos pontos do país.
Em relação às festividades de comemoração do dia 13 de maio de 1888, não existe nenhum registro nos livros relativos à Uberaba. Analisando os documentos, como os livros de Atas da Câmara Municipal de Uberaba, não se registrou nada nas sessões à respeito da “Campanha Abolicionista” e não foi feito também nenhum registro relativo ao acontecimento tão importante para a história do Brasil, como a Abolição da Escravidão em 13 de maio de 1888, muito festejada no Rio de Janeiro. Conclui-se que esta falta de registro foi oportuna às elites dominantes de Uberaba, visto que nenhuma autoridade da Câmara Municipal fez menção ao fato.
Então, irmãos negros! Companheiros dos diversos ternos de Congo, Moçambique, Catupés, Vilão, Afoxés e outros, embora não conste nenhum registro sobre o evento do 13 de maio em Uberaba, sabemos que o maior registro está dentro dos nossos corações. Tudo aquilo que vivemos e aprendemos com os nossos antepassados é o que nos rege e nos dá força. Sabemos que, ainda nos dias de hoje, somos muitas vezes sucumbidos às humilhações da sociedade. Ninguém pode roubar e até mesmo tirar o som de nossos tambores, atabaques, gungas, patangongas e a emoção de colocarmos nosso fardamento, embainhar nossas espadas e agradecer aos nossos ancestrais pela liberdade conquistada.



FELIZ 13 DE MAIO!
Superintendência do Arquivo Público
Diretor do Departamento de Pesquisa – Historiador João Eurípedes de Araújo


Referências:

1      Liana Reis, Departamento de História da PUC-MG
2      Eduardo Silva, Fundação Casa de Rui Barbosa.

Comentários

Iara disse…
Joãozinho Araújo, sem perder a mão da história! Parabéns pela publicação, Ojuara...
Beijos

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