A CÂMARA MUNICIPAL E A LEI ÁUREA DE 13 DE MAIO DE 1888
A Superintendência de Arquivo Público,
através das pesquisas realizadas por seus historiadores no acervo documental
das Atas da Câmara Municipal de Uberaba,
totalizando mais de mil páginas referentes ao período de 1857 a 1917 constatou
que não foi divulgada pelos vereadores da Câmara Municipal de Uberaba a
aprovação da Lei Áurea, que aboliu a escravidão no Brasil em 13 de maio de 1888.
Prédio da Câmara Municipal de Uberaba em fins do século XIX.
Foto: Acervo: Superintendência de Arquivo Público |
O silenciar da Câmara Municipal, na época contrariava a Lei Imperial de 1º de outubro de 1828, promulgada por Dom Pedro I, “Imperador Constitucional e Defensor Perpetuo do Brazil”, que serviu para estabelecer novas normas de estruturação e de funcionamento das Câmaras Municipais.
O silenciar da Câmara Municipal, na época contrariava a Lei Imperial de 1º de outubro de 1828, promulgada por Dom Pedro I, “Imperador Constitucional e Defensor Perpetuo do Brazil”, que serviu para estabelecer novas normas de estruturação e de funcionamento das Câmaras Municipais.
As Câmaras Municipais, anteriormente à
lei de 1828, possuíam mais autonomia e a partir dessa lei representou um
retrocesso ao colocar as Câmaras Municipais sob o domínio dos Governos
Provinciais, que por sua vez também estavam subordinados as determinações do
Governo Imperial.
Assim,
entre outras coisas, as Câmaras Municipais tinham que responder sobre tudo
aquilo que os Governos Provincial e Imperial quisessem saber e divulgar para a
população, informando através de editais nos lugares de maior movimento da
cidade.
A Câmara Municipal de Uberaba durante
muitos anos fielmente cumpriu a lei de 1º de outubro de 1828, confirmado pelos
registros nas Atas da Câmara, a seguir:
- Na sessão da Câmara Municipal de 14 de janeiro de1857 menciona-se o ofício recebido do governo provincial, a seguir:
Data: 14/01/1857
Sessão: Ordinária
Assunto:
Leo-se hum
ofício do Excelentissimo Governo, de 22 de Dezembro do anno proximo passado
acusando o recebimento da Ata de Apuração Geral dos Vereadores Eleitos e a
relação dos Juizes de Paz dos Distritos dos Municipios; [...]
Vereadores presentes: Barcellos,
Rocha, Rosa, Gondim, Machado, Alves de Oliveira, Souza, Santos e Marinho;
Secretário: Silverio Fernandes Leão
Livro: 01
Página (s): 02 v e 03
- Na sessão da Câmara Municipal de Uberaba, datada de 14 de janeiro de 1861 foi lida a seguinte circular da Câmara Municipal da Corte, transcrita a seguir:
Data: 14/01/1861
Sessão:
Ordinária
Assunto:
[...] - circular
da Camara Municipal da Corte, de 30/07/1860, trazendo anexo estatuto da Caixa
Municipal de Beneficencia do Municipio da Corte, ficou a Camara informada e
acuse recebimento; [...]
Vereadores
presentes: Presidencia do vereador Rocha, Machado, Pereira de Oliveira, Rosa,
Penna e Souto.
Secretário:
Silverio Fernandes Leão
Livro: 01 Página (s): 85 v, 86 e 86 v
- No dia 16 de janeiro de 1862, a Câmara Municipal de Uberaba, abraçando os movimentos patrióticos do Império, afirmou que colaboraria com a divulgação de uma lista para angariar fundos para um monumento em homenagem a José Bonifácio de Andrada e Silva, o “Patriarca da independência”. E por ter mandado um forte abraço e felicitações ao Monarca D. Pedro II, pelo brilhante feito, de armas de nossa esquadra na Batalha de Riachuelo, recebeu de volta agradecimentos de sua Majestade Imperial através de um ofício de 12 de dezembro de 1865.
Data: 16/01/1862
Sessão: Ordinária
Assunto:
[...] - oficio
dos membros do Instituto Histórico Brasileiro de 18/08/1861, informando que
correrá uma lista com nomes de cidadãos e quantia determinada para elaborar o
Monumento de Jose Bonifacio de Andrade e
Silva, deliberou a Camara que passará a lista para diversos cidadãos; [...]
Vereadores presentes: Presidencia do
vereador Machado, Silva, Penna, Rosa, des Genetes.
Secretário: Silverio Fernandes Leão
Livro: 01 Página (s): 108 v, 109 e 109 v
- Promulgada em 28 de setembro de 1871 a Lei do Ventre Livre, que libertava todos os cativos filhos de mulher escravas, foi também registrada na Ata da Câmara de Uberaba no dia 04 de dezembro de 1871, transcrita a seguir:
Data: 04/12/1871
Sessão: Extraordinária
Assunto:
-
[...] leo-se uma circular do Excelentissimo Presidente da Provincia de 14 de
Outubro proximo findo remetendo incluso a Lei 2.040, que declarou livres os
filhos de mulher escrava. Deliberou a Camara que respondesse ao mesmo
Excelentissimo Senhor que ficou sciente e que tinha feito publico por editaes;
[...]
Vereadores
presentes: Marques,
Machado, Pereira,Castro, Penna, Valle, Wenceslao e Rocha.
Secretário: Antônio José da
Fonseca
Livro: 02 - Página (s): 16 v, 17, 17 v e 18
Nos documentos supracitados há constatação de que
a Câmara Municipal de Uberaba divulgava as notícias do governo da Província e
da Corte.
Entretanto, no dia 14 de maio de 1888 os
vereadores da Câmara Municipal de Uberaba se reuniram, mas, nada relataram sobre a Lei Áurea, de 13 de
maio, que libertou os escravos no Brasil. Essa Lei foi decretada pela
Princesa Imperial Regente, Isabel Cristina Leopoldina Augusta Micaela Gabriela Rafaela Gonzaga de
Bragança e Bourbon, que substituindo temporariamente seu pai D. Pedro II,
decretou a Lei Áurea abolindo a escravidão no Brasil. Foi publicada no
Diário Oficial de 14 de maio de 1888. Entende-se que nesta época seria
impossível uma notícia correr tão rápido!
Princesa Isabel em cena pensativa pousa para fotografia. Fonte: Família Imperial. |
Mas,
na sessão seguinte da Câmara Municipal em 07 de junho de 1888, vinte e quatro dias
depois nada foi mencionado nessa sessão da Câmara Municipal sobre a Lei Áurea,
que aboliu a escravidão no Brasil. O assunto mais importante nesse dia foi à
leitura de um ofício do Presidente da Província de Minas Gerais, solicitando
informações sobre o fechamento da estrada que ligava Uberaba a capital de
Goiás, interrompido pelo Senhor Antônio Borges de Araújo. Também nas Atas da
Câmara posteriores a 07 de junho nada foi constado referente à Lei Áurea.
CÂMARA MUNICIPAL
DE UBERABA IGNOROU A LEI ÁUREA, QUE ABOLIU A ESCRAVIDÃO EM 13 DE MAIO DE 1888
- Primeiro Ato de Descaso
De
acordo com a Lei de 1º de outubro de 1828, o Art. 26 determina que quando
ocorresse algo de extrema importância para o país, o Presidente da Câmara
Municipal poderia convocar os vereadores para sessão extraordinária. Do dia 15
de maio ao dia 06 de junho o Presidente da Câmara, José Joaquim de Oliveira Teixeira, não convocou
nenhuma reunião para tratar de um assunto tão importante para a cidade e para o
Brasil como a abolição da escravidão.
- Segundo Ato de Descaso
Por
que o membro da Sociedade Abolicionista
Filhas do Calvário e também o único vereador antiescravagista de nossa
egrégia Câmara, Horácio Thomaz de Miranda, esteve presente em quase todas as
sessões até o dia 30 de abril de 1888 e desapareceu de seu assento justamente durante
os dias cruciais da Lei Áurea, só reaparecendo no dia 11 de julho de 1888?
- Terceiro Ato de Descaso
Por que um comunicado Imperial
não teve sequer uma linha de lembrança na primeira sessão oficial da Câmara do
dia 07 de junho de 1888, após a publicação da Lei Áurea? Crime de lesa-
majestade?
É importante observar que a Lei
Áurea não acabou com o preconceito em relação ao negro, visto que após a
abolição eles ficaram marginalizados, sem moradia, sem emprego e jogados à
própria sorte. Na verdade não houve um projeto de governo pós-abolição que inserisse
o negro no contexto econômico e social do país.
O historiador José Murilo de Carvalho no livro Cidadania no Brasil:
o longo caminho diz que: “a escravidão foi o fator mais
negativo para a cidadania”. Para Carvalho (p. 24) foram raras as manifestações
cívicas durante a Colônia, salvo as revoltas escravas (na qual destaca a de
Palmares). Quase todas as outras revoltas foram conflitos entre setores
dominantes ou reações de brasileiros contra o domínio colonial (no qual
destaca-se a Inconfidência Mineira e as Revoltas dos Alfaiates e Pernambucana).
Segundo o autor, o período colonial chegou ao fim “com a grande maioria da
população excluída dos direitos civis e políticos e sem a existência de um
sentido de nacionalidade”. (p. 25)
O Brasil foi o último país de tradição cristã e ocidental a libertar os
escravos. A persistência da escravidão significa que os valores da escravidão
eram aceitos por quase toda a sociedade. No Brasil, “aos libertos não foram
dadas nem escolas, nem terras, nem empregos. As consequências disso foram
duradouras para a população negra, que ainda ocupa posição inferior em todos os
indicadores de qualidade de vida. É a parcela menos educada da população, com
os empregos menos qualificados, os menores salários, os piores índices de
ascensão social” (p. 52).
O historiador José Murilo diz que: “a libertação dos escravos não trouxe
consigo a igualdade efetiva. Essa igualdade era afirmada nas leis, mas negada
na prática” (p. 53).
A escravidão negra vigorou no
Brasil por mais de trezentos anos, uma instituição cruel que mutilou e
desagregou várias famílias negras que vieram da África.
É importante destacar que os
negros contribuíram para o desenvolvimento do Brasil, além de deixarem um
legado na música, na dança, na culinária e na configuração do povo brasileiro.
A trajetória de luta do negro
continuou após a abolição, eles se organizaram e têm conquistado o seu espaço
com dignidade na sociedade brasileira.
POR QUE A CÂMARA MUNICIPAL NÃO FEZ MENÇÃO
À LEI ÁUREA QUE ABOLIU A ESCRAVIDÃO NO BRASIL EM 13 DE MAIO DE 1888?
SÃO
127 ANOS DE SILÊNCIO!
O
Presidente da Câmara Municipal de Uberaba, Luiz Humberto Dutra diante das
pesquisas realizadas pela equipe da Superintendência de
Arquivo Público, de Uberaba, nos Livros de Atas da
Câmara Municipal de Uberaba, imediatamente determinou uma retratação
pública em 13 de maio de 2015, fazendo constar nos registros da Casa
Legislativa do reconhecimento pela Câmara Municipal de Uberaba da Lei Áurea de
13 de maio de 1888, que aboliu a escravidão no Brasil.
SUPERINTENDÊNCIA DE ARQUIVO PÚBLICO
REVISÃO E REDAÇÃO:
Superintendente de Arquivo Público: Marta Zednik de Casanova
PESQUISA E REDAÇÃO:
Historiador João Eurípedes de Araújo
PESQUISA:
Pesquisador Miguel Jacob Neto
FOTOS:
Acervo Superintendência de Arquivo Público
FONTES
Livros de Atas da Câmara Municipal de Uberaba -1857 a 1917
BIBLIOGRAFIA:
Carvalho, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
Câmara de Manaus. Disponível em:http://www.cmm.am.gov.br/origem-e-funcoes-das-camaras-municipais/. Acesso em: 12 de março de 2015.
Jornal de Uberaba. Disponível em: http://www.jornaldeuberaba.com.br/cadernos/opiniao/2608/treze-de-maio-de-1888 Acesso em: 10 de março de 2015.
Sua pesquisa. com. Disponível em: http://www.suapesquisa.com/historiadobrasil/abolicao.htm
http://www.infoescola.com/historia-do-brasil/lei-aurea/. Acesso em: 05 de março de 2015.
Anais do Simpósio Nacional de História de 2013. Disponível em: http://www.snh2013.anpuh.org/resources/anais/27/1371240384_ARQUIVOARTIGOANPUHFINALJuheMyrai.docxPIBIC.p
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