Notícias do Jornal Lavoura e Comércio (Ano 1899) - O caso de uma tourada em Uberaba
No Brasil Colonial, em especial no Rio de Janeiro, as touradas passaram a ser promovidas ocasionalmente a partir de meados do século XVII. Eram atividades, comumente dirigidas a cerimônias festivas de datas importantes relacionadas à Monarquia portuguesa. (MELO, 2013, p.2) Contudo, a popularidade dos eventos dessa natureza foi realçada durante a permanência da Corte Portuguesa no Rio de Janeiro entre os anos de 1808 a 1821.
Após
o processo de Independência, durante um longo período sem noticiar ocorrências dos
espetáculos conhecidos como “corridas de touros”, apenas algumas apresentações
esporádicas foram promovidas na Capital do Império, entre as décadas de 1840 a
1850. Elas se davam em modelos comerciais custeados por empresários que
buscavam atender a demanda de um público pagante ávido por este tipo de
entretenimento.
Arquibancada lotada em uma tourada em Porto Alegre. Autor: Vitor Calegari, 1907 |
Nesse
mesmo contexto, à medida que cresciam a promoção dos espetáculos das “corridas
de touro”, também insurgiam ácidas críticas frente essas práticas em circuitos
da imprensa do Rio de Janeiro. Isso se dava em meio às intensas mudanças no
cotidiano da vida pública, em decorrência de uma sensível incorporação de
discursos modernizadores no imaginário da população letrada carioca, tendo em
vista a adesão de valores do “mundo civilizado europeu” que começava condenar
as touradas. (SCHWARCZ, 1998)
Posteriormente,
nota-se no período que segue de 1876 ao final do século XIX, a retomada das
“corridas de touro” em inúmeros lugares do País. (MELO, 2013, p.5).
Em
13 de Julho de 1899 uma notícia chamava a atenção na imprensa de Uberaba, dando
conta que iria chegar à cidade uma empresa “itinerante” para promoção de um “Circo
de Tourada”. O fato foi revelado por um redator do Jornal “Lavoura e Comércio”
que narrava com desprezo a chegada da caravana da seguinte maneira:
“Estamos ameaçados de uma visita de uma
companhia de touradas. Na Praça da Liberdade, ergue-se o circo onde bravos
toureadores vão exibir sua agilidade e maestria, entre aplausos, pelegas e
cabeçadas de boi”. (LAVOURA E
COMÉRCIO, 13 DE JULHO DE 1899)
Segue
o jornalista, fazendo um apelo ao público leitor:
“Pela minha parte e a pedido de muitas
famílias convido o ilustrado público uberabense a não ir. Faça-se o vácuo em
roda e dentro do circo, porque só assim faremos cair de uma vez, aquele quixotesco
e brutal divertimento, aquele hominioso legado que dos tempos bárbaros que a
civilização moderna ainda não conseguiu abolir”. (LAVOURA E COMÉRCIO, 13 DE JULHO DE 1899)
Não poupando palavras aos promotores daquele
evento, o jornalista segue dizendo:
“Não é de bom gosto que uma população
civilizada fique assistindo de palanque ao inaudito martírio de inocentes
animais que depois de fechados 3 dias num quadrado, sem comer nem beber ,
exposto ao rigor do sol, são provocados no circo a uma agressão selvagem , no
fim da qual, se não inutilizam o desalmado provocador são submetidos a
terríveis torturas , além da fome que os devora e de uma sede de 3 dias.” (LAVOURA E COMÉRCIO, 13 DE JULHO DE 1899)
Finaliza
com uma advertência ao empresário de touradas:
“O digno empresário bem que podia captar
os meus emboras levando sua trupe para a pátria das touradas”. (LAVOURA E COMÉRCIO, 13 DE JULHO DE 1899)
Atualmente
o debate sobre o bem-estar animal invadiu diversas esferas de discussões. Mais
do que o cuidado e respeito com os animais domésticos, de zoológicos e de
circos, existe um amplo debate sobre o bom trato para com os animais de
pecuária durante sua vida. Cada vez mais, problematizam-se questões como o
estresse em confinamentos, alimentação, proximidade com o ambiente natural e,
principalmente o abate sem sofrimento.
Contudo,
num momento da busca de tantas alternativas, ainda persistem em muitos lugares,
atrocidades como caças, acoites de toda a sorte, seja ainda nas touradas ou
práticas similares, brigas de galo entre outras atividades de agressão e
desrespeito aos animais. Do momento desta publicação do “Lavoura e Comércio” aos
nosso dias, pouco avançamos, resta muito a se conquistar...
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