02 de março: Reflexões sobre as origens Freguesia de Santo Antônio e São Sebastião de Uberaba em 1820 até os anos de 1960
Para entender a formação
da Freguesia de Santo Antônio e São Sebastião de Uberaba é necessário uma breve explicação a respeito do local exato onde ela se instalou. Com a
expansão das fronteiras de exploração a oeste do Desemboque, em 1806, o
sertanista José Francisco de Azevedo instalou um pequeno núcleo colonial nas
cabeceiras do Ribeirão do Lageado (dos Ribeiros). Este núcleo era formado por
algumas dezenas de cabanas habitadas por colonizadores emigrados do Julgado de
Nossa Senhora do Desterro do Desemboque. Os índios aldeanos, por sua vez,
viviam às margens do córrego dos Lages, na aldeia conhecida como Uberaba Falsa.[1] O
núcleo de colonizadores, que distava cerca de 15 km da aldeia, ficou
conhecido como Arraial da Capelinha (ou Lageado), sendo ali instalada por
invocação de Santo Antônio e São Sebastião.
Figura 1. Fonte:Lourenço, 2002
Segundo Fontoura, em 1809, o Sargento-mor Antônio Eustáquio da Silva Oliveira, obteve o título de Regente e Curador dos índios do Sertão da Farinha Podre. Desta feita, o dito sargento-mor Antônio Eustáquio realizou algumas explorações na região, entre os anos de 1809 e 1812, juntamente com alguns dos imigrantes geralistas,[2] os quais se estabeleceram fazendas, atraídos pelas notícias de alta fertilidade das terras. Lourenço aponta para a importância das redes de parentesco para a ocupação das terras a oeste do Desemboque. O sargento Eustáquio (ou Major Eustáquio, como ficou conhecido) recebeu seu título de curador devido a influências de seu irmão e, assim como ele, várias outras famílias, que posteriormente se configurariam como relevantes no contexto social do município de Uberaba, vieram à região.
Segundo Fontoura, em 1809, o Sargento-mor Antônio Eustáquio da Silva Oliveira, obteve o título de Regente e Curador dos índios do Sertão da Farinha Podre. Desta feita, o dito sargento-mor Antônio Eustáquio realizou algumas explorações na região, entre os anos de 1809 e 1812, juntamente com alguns dos imigrantes geralistas,[2] os quais se estabeleceram fazendas, atraídos pelas notícias de alta fertilidade das terras. Lourenço aponta para a importância das redes de parentesco para a ocupação das terras a oeste do Desemboque. O sargento Eustáquio (ou Major Eustáquio, como ficou conhecido) recebeu seu título de curador devido a influências de seu irmão e, assim como ele, várias outras famílias, que posteriormente se configurariam como relevantes no contexto social do município de Uberaba, vieram à região.
Esses fazendeiros, muitas vezes, já traziam alguma
escravaria, recebida de herança, mas a regra era que geralmente não tinha
muitas posses. Por isso, desde o início, dada a dificuldade inicial de comprar escravos,
esses homens se preocupavam em ocupar suas fazendas com posseiros pobres
(agregados), transformados, assim, num campesinato dependente. [3]
Segundo Pontes,[4] no
ano de 1806, o major Eustáquio visitou o núcleo dos sertanistas e notou a falta
de recursos naturais que pudessem garantir o confortável estabelecimento e
crescimento do povoado. Por isso, ele teria se voltado às terras aldeanas, na
margem direita do Córrego dos Lages, e ali construiu uma fazenda.[5] Algum tempo depois, a cerca de três
quilômetros dali, ainda às margens daquele córrego, ele construiu uma
residência,[6] usada
como retiro, e que deu origem ao lugar conhecido por Paragem de Santo Antônio.
A partir da construção deste retiro do Major, muitos fatores levaram à
migração dos moradores do Arraial da Capelinha e outras regiões para aquele
lugar. Ainda de acordo com Pontes, a influência do Major Eustáquio, seu
crescente poder nos negócios públicos, e
a conseqüente posição social elevada, atraiu os moradores
daquele povoado para junto de seu retiro. Além desse motivo, podemos destacar
outros como a proteção promovida pelo Major e, acima de tudo, as melhores
condições naturais existentes no local por ele estabelecido. Esse foi, pois, o
núcleo que originou a cidade de Uberaba, descrito pelo viajante Auguste de
Saint-Hilaire em 1819:
O arraial é composto de umas
trinta casas espalhadas nas duas margens do riacho (Córrego da Lage) e todas,
sem exceção, haviam sido recém construídas sendo que algumas ainda estavam
inacabadas quando ali passei. Muitas delas eram espaçosas e feitas com esmero
(...). Os habitantes do lugar estavam tentando conseguir com que o Governo
Central elevasse o arraial a sede de paróquia.[7]
Figura 2 – “O patrimônio de uma capela se constitui
por entre as sesmarias, contribui para o seu sustento, possibilita o acesso a
terra.” A primeira capela de Uberaba foi erigida nas margens do Córrego Lageado
[onde se estabeleceram os sertanistas que vieram com José Francisco de Azevedo]
com o Orago de Santo Antônio e São Sebastião. “A Capela acolhe moradores em
pequenas porções de uma gleba. Torna-se instrumento de urbanização e cria uma
nova paisagem”. Por volta de 1815
a 1817, em Uberaba, a população gradativamente,
transferiu-se para as proximidades do córrego da Lage, onde já havia um pequeno
número de moradores, trazendo um Orago de Santo Antônio e São Sebastião para
uma capela próxima. (adaptação de MARX, Murilo, Cidade no Brasil: terra de quem?, São Paulo: Edusp, 1989, realizada
pelos historiadores do Arquivo Público de Uberaba. Boletim Informativo do
Arquivo Público, n. 6, março de 1995, p. 4).
Figura 3 – Uberaba torna-se um próspero local. Em
1820, é elevado a Freguesia, sendo a pequena capela elevada à condição de
Matriz. Em 1836, torna-se vila e ganha um rossio: uma praça onde o povo
encontra-se para buscar água da fonte do indaiá, comprar e vender utensílios. E
uma nova matriz está sendo construída. Nesse ínterim, “uma câmara administrará
o município. Uma nova etapa de vida urbana e de ordem fundiária”. Uberaba é
elevada a condição de cidade em 1856.
A construção da Matriz está ganhando duas torres e a pequena capela está sendo
demolida. (adaptação de MARX, Murilo, Cidade
no Brasil: terra de quem?,São Paulo: Edusp, 1989, realizada pelos
historiadores do Arquivo Público de Uberaba. Boletim Informativo do Arquivo
Público, n. 6, março de 1995, p. 4).
Figura 4 – “Cresce a vila e se adensa, aumenta a
importância dos limites de todo o tipo e se multiplicam as questões de
alinhamento”. Termina a construção da Matriz, que ganha dois sinos. “Surge o
loteador, o empreendedor imobiliário que retalha uma gleba, vende suas
parcelas, passa igualmente a desenhar a cidade”. A Matriz é reformada, ficando
somente uma torre, o novo cemitério, inaugurado em 1900, permanece até hoje.
(adaptação de MARX, Murilo, Cidade no
Brasil: terra de quem?,São Paulo: Edusp, 1989, realizada pelos
historiadores do Arquivo Público de Uberaba. Boletim Informativo do Arquivo
Público, n. 6, março de 1995, p. 4).
De forma resumida, esta
representação gráfica mostra a formação urbana de Uberaba. Na primeira figura
temos a instalação da primeira capela, transferida do local onde haviam se estabelecido os
sertanistas que vieram com José Francisco de Azevedo. O local preciso desta
primeira capela é onde hoje está a Escola Estadual Minas Gerais, no bairro São
Benedito. Vemos na segunda figura que a Capela estava no alto de um morro, com
algumas casas abaixo. Atrás da capela, como era costume, havia o cemitério. A
matriz, que está no mesmo local até hoje, começou a ser construída algumas
centenas de metros morro abaixo, onde hoje se localiza a praça central, Rui
Barbosa.
Nos anos de 1990,
historiadores do então Arquivo Público de Uberaba, buscando atender reivindicações
para mudanças da data de aniversário da cidade, realizaram um esforço em mudar esta data. Anos atrás, o dia 2 de maio era a data oficial do aniversário de fundação da cidade.
Esta data foi escolhida reportando-se à fundação da Vila, em 1836. Hoje, o dia
oficial é o 02 de março, data do decreto régio que estabeleceu a criação da
Freguesia de Santo Antônio e São Sebastião de Uberaba.
É consensual entre os historiadores que a formação das freguesias é o que, na
maioria das vezes, determina o futuro caráter dos municípios e, em Uberaba isso
não foi diferente.
Sobre as Freguesias, pode-se entender que:
A institucionalização da vida destas tantas e tão
dispersas comunidades se dava pela oficialização de sua ermida, de sua capela
visitada por um cura, pela elevação um dia a Matriz, ou seja, a paróquia ou
freguesia. Era o reconhecimento da comunidade de fato e do direito perante a
Igreja e, portanto, perante o Estado. Não era apenas o acesso ao batismo, ao
casamento, ao amparo aos enfermos, ao sacramento na morte, mas também a
garantia do registro de nascimento, de matrimônio, registro oficial com todas
as implicações jurídicas e sociais. Era o usufruto da formalidade civil com
todo o direito e segurança que pudesse propiciar.[8]
Posteriormente a elevação de Vila
em 1836 como já dissemos acima, a lei nº
125[9],
de março de 1839, o Município divide-se em seis distritos:
1-
o da sede
2- Santíssimo
Sacramento (Sacramento)
3-
Dores do
Campo Formoso (Campo Florido)
4-
N. Sra. Do Carmo de Morrinhos (Prata)
5-
Monte Alegre
6-
São José do Tijuco (Ituiutaba)
Em 1843,
acrescenta-se-lhe o distrito de Brejo Alegre (Araguari) e, em 1848 perde os
distritos de Sacramento, Monte Alegre e Carmo de Morrinhos. No ínterim de 1851
e 1858 foram criados os distritos de São Pedro do Uberabinha (Uberlândia) e
Carmo do Frutal. No período de 1882 a 1888, são desanexados os distritos de
Brejo Alegre e Carmo do Frutal, seguidos
posteriormente por São Pedro de Uberabinha e São José do Tijuco em 1901. Em
1891, era criado o distrito de São Miguel do Veríssimo, desanexado em 1938,
juntamente com os de Campo Formoso e Conceição das Alagoas. Assim concluímos
que o Município de Uberaba e o de Araxá compreendiam a ocupação de quase a
totalidade das terras da região denominada de Triângulo Mineiro. Sendo que a
região foi sendo fragmentada quando
emanciparam os citados municípios acima.
A cidade de Uberaba: aspectos do desenvolvimento no
século XIX e início do XX.
Estando esclarecidas as origens de
Uberaba, partamos agora para a abertura da discussão das principais
características econômicas, sociais e políticas que marcaram o seu
desenvolvimento.
O desenvolvimento de Uberaba tem
suas origens nos mais variados planos, mas, num primeiro momento, podemos
destacar sua localização geográfica como um fator relevante para que se entenda
a maneira como se deu este processo. Conforme já revelamos, Uberaba situa-se no
local que, no século XIX, era a “porta de entrada” para os sertões do Brasil
central.
Conforme a historiadora Eliane Marquez
de Resende,[10]
entretanto, foi a pecuária a primeira atividade expressivamente praticada no
município aliada, é claro, à agricultura de subsistência.
Em decorrência de sua posição geográfica e com o
incremento das atividades pastoris, Uberaba tornou-se, já na primeira metade do
século XIX, resultando disso o constante crescimento de seu povoado e sua
projeção como entreposto de comércio de gado vacum.[11]
Este processo também pode ser
observado em outras localidades do Brasil central, o que gerou a necessidade de
que se intensificassem as vias de comunicação entre os municípios, e Uberaba,
já em seus primeiros anos como Freguesia, sob esforços do major Eustáquio,
ganhou um porto às margens do Rio Grande – na divisa com a província de São
Paulo – e uma estrada que ligava aquele porto ao povoado. Dessa forma, estavam
postas as condições para que a futura cidade se tornasse parte importante das
rotas de comércio e transporte de produtos que iam até a corte. Esta atividade
comercial ganhou força a medida que o século XIX chegava ao fim, devido à
expansão da economia cafeeira no oeste paulista, o que revitalizou as rotas
comerciais na antiga estrada do Anhanguera, a partir de Campinas.
Com relação à mão de obra escrava,
Uberaba guardava algumas características próprias. Segundo Resende, as fazendas
possuíam um certo número de escravos, o que confluía com a conjuntura nacional,
uma vez que esta era a base do trabalho naquele período. Contudo, havia o
problema de que pequenos proprietários não tinham muitas das vezes condições de
pagar os preços do escravo, que se tornavam cada vez maiores, principalmente
com o final do tráfego negreiro em 1850.
Em 1820, a Freguesia de
Santo Antônio e São Sebastião de Uberaba possuía 1621 habitantes, dos quais 417
eram escravos. Em 1854, o município possuía cerca de 13.000 habitantes, sendo
que 4000 eram escravos, o que demonstra um alto índice e evidencia a pujança
econômica adquirida pelo município, ainda mais se levarmos em conta que o
progresso de Uberaba não dependeu diretamente da rentabilidade de um produto
agrícola, traço marcante da evolução histórica brasileira.
Tratando do plano nacional, os primeiros
anos da República foram muito conflituosos sob diversos aspectos. Ela havia
herdado da Monarquia um grande déficit na balança de pagamentos. Importações
oneravam em muito o tesouro; as despesas com a infra-estrutura urbana eram
enormes, pois se expandia a rede ferroviária; aparelhavam-se melhor os portos,
instalavam-se fábricas. Além disso, eram altos os gastos com o trabalho
assalariado, além de divergências tremendas com o novo sistema de trabalho; e a
marginalização de muitos dos ex-escravos.
Os anos que antecederam a abolição da
escravidão, e de certa maneira, a política de concessões e incentivo à
imigração já vinham sendo fundamentadas. Nos primeiros anos da República, a
política de incentivo a imigração encontra um respaldo mais elevado. Segundo
dados da Superintendência do Arquivo Público de Uberaba/MG,[12] na
região do Triângulo Mineiro:
A imigração italiana é
predominante em Uberaba, Conquista e Sacramento. Procedentes da Hospedaria
Horta Barbosa no período de 1894 a 1901 encontramos: 156 famílias compostas de
777 pessoas. (...) São agricultores para fazenda de café de Sacramento,
Conquista outras culturas e atividades em Uberaba. Conquista em 1940 possuía
uma população de aproximadamente 25.000 imigrantes, a maior de todo Triângulo
Mineiro.
Os imigrantes na finalidade de
acastelarem políticas de seus interesses criaram diversas associações, no
período de transição do século XIX às primeiras décadas do século XX. Segundo
Roberto Capri [13], existiam
até 1916:
As de caridade – “Associação das Damas de
Caridade”, “Santa Casa de Misericórdia”, “Associação São Vicente de Paula”,
“Associação Beneficente -Oito de
Setembro”.
As de beneficência – “Associação Portuguesa de
Beneficência 10 de dezembro”, “Liga Operária”, “Unione Italiana
Fransceco Carrara”, Sociedade Beneficente União Síria,”“Caixa Escolar João
Pinheiro” “, “Societá di Mútuo Soccorzo Fratellanza Italiana”, “Sociedad
Española Mateu Sagasta”, “Sociedad Española de Socorros Mútuos”, “Centro
Espírita Uberabense”..
A Imigração se perfaz em maior número no
Triângulo Mineiro com italianos, mas vieram levas de espanhóis, portugueses,
árabes, asiáticos e, em menor número, alemães.
Assim sendo, a imigração em Uberaba
encontra em parte, uma possibilidade de inserção no mercado de trabalho
favoravelmente urbano, diferenciando-se do tipo de atividade a que os
imigrantes desenvolveram em outras regiões que receberam imigrantes, como
Conquista, onde os trabalhadores estavam ligados às atividades agrícolas. Este
aspecto se deu devido ao caráter comercial que o município vinha assumindo até
aquele momento, com a vantagem da linha férrea Mogiana finalizar seus trilhos
na Estação de Uberaba. O que favoreceu um comércio dos produtos advindos do
porto de Santos/SP fazendo da região centro cosmopolita frente ao Brasil
Central.
Figura 9 – Praça Rui Barbosa, ponto de encontro de tropeiros, 1908. Fonte: Arquivo Público de Uberaba.
A imigração estrangeira
tornou-se notabilíssima, abriram-se diversos negócios alguns dos quais com
renda superior a 1.700 contos de réis. O trânsito de carros de boi era
colossal.[14]
Essa conjuntura permaneceu até 1897,
quando a linha férrea tocou as pontas de seus trilhos em Araguari, e logo
entrou em decadência em 1911, quando a Ferrovia Noroeste do Brasil, penetrou o
Estado do Mato Grosso canalizando-o ao Estado de São Paulo. Todavia, naquele
contexto, esse movimento modernizador, foi capaz de instaurar pioneiramente uma
pequena industria manufatureira, notavelmente de italianos.
São quatro Fábricas de
cerveja, três Fábricas de macarrão, uma Fábrica de Barrigueira, uma Fábrica de
Tecidos, uma Fábrica de Carroça, uma Fábrica de Vinho, uma fábrica de
Cangalhas, Cia. de Seguros, quatro Alfaiatarias dentre diversas Casas
Comerciais e Profissionais Liberais. [15]
Fator importante que caracteriza a cultura
econômica uberabense, foi a formação de uma classe de criadores de gado,
que em meados de 1880, introduziram os primeiros exemplares das raças Zebu,
trazidos do Rio de Janeiro e depois diretamente de sua origem no continente asiático.
Com a chegada da Ferrovia a Araguari, em
1896, passando por São Pedro de Uberabinha (atual Uberlândia), segundo Resende,[16] o
comércio se transferiu àquelas praças e a importância das atividades pecuárias
voltaram à cena (nunca haviam saído, só estavam em segundo plano) e os
pecuaristas procuraram, desde então, melhorar o gado crioulo e caracu existente
no município. A opção pela importação do gado Zebu, da Índia, acabou se
mostrando a melhor e este fato foi, em certa medida, determinante para o
crescimento desta atividade na cidade e na região, pois as raças indianas que passaram a se
desenvolver aqui provocaram impactos na pecuária em todo o país. Em decorrência de um longo processo histórico, Uberaba, atualmente, é o maior centro na pesquisa e melhoramento genético das raças zebuínas no mundo.
Esta atividade pecuária fortaleceu
rapidamente o poder político e social daqueles que a praticaram em Uberaba e teve colaboração com a modernização da indústria frigorífica e o advento da exportação de carne brasileira congelada para Europa durante a 1ª Guerra Mundial.
Paralelamente
a essa construção de poder e intrinsecamente ligada a ela, a Igreja católica,
encontrava-se fortemente enraizada na região, conforme demonstram dados do
início do século XX, segundo levantamentos feitos em 1916.
O povo do Triângulo Mineiro é essencialmente católico.
Em Arraial da Água Suja, há o Santuário
de N. S. da Abadia(...). Há em Araguari, algumas famílias protestantes(...)
Espíritas se contam em toda a localidade do Triângulo. O núcleo de espíritas
mais considerável está na Fazenda de Santa Maria do Capim Branco, (Conquista)
onde os adeptos mantêm um periódico intitulado “A Alavanca”, e uma farmácia que
distribui, gratuitamente, remédios a todas as pessoas que o procuram. Em
Uberaba há um centro ao qual se acham filiados nove grupos.
O Bispado de
Uberaba está todo contido nas divisas do Triângulo Mineiro e abrange ainda
alguns municípios a leste. Foi criado em Dezembro de 1907 e solenemente
instalado a 24 de Maio do ano seguinte. Tem como seu primeiro Bispo, o Exmo e
Revmo. D Eduardo Duarte Silva, que reside na cidade de Uberaba, sede, em
Palácio Episcopal. A divisa compreende 47 freguesias.Tem Cabido composto de dez
cônegos, com dispensa de residência.s ordens religiosas.
As ordens
religiosas estão estabelecidas, desde de 30 frades da Ordem Dominicana, como a
mais antiga instalada no Brasil. Posteriormente em 1885, estabeleceram-se na
mesma cidade, as Irmãs da Terceira Ordem de São Domingos, que mantêm o Colégio
Nossa Senhora das Dores, equiparado, hoje, as Escolas Normais do Estado de
Minas Gerais.
Uberaba ainda
conta, com a residência na Igreja de Nossa Senhora da Abadia, diversos
representantes da Ordem dos Agostinianos Recolletos, e a Congregação dos Irmãos
Maristas que mantêm desde 1904, a direção do Ginásio Diocesano do Sagrado
Coração de Jesus.
Em Campo Belo
do rio Verde (município do Prata), estabeleceu-se um colégio da Congregação de
São Vicente de Paula ou Lazaristas, os quais ali mantiveram desde 1820, até a
pouco um estabelecimento secundário que inumeráveis benefícios prestou a
mocidade do Triângulo Mineiro.[17]
A Igreja Católica em Uberaba, assim
como no resto do Brasil, com o desmonte do Estado Imperial, voltou suas
atividades para outros alheios às questões burocráticas estatais, investindo em
irmandades e escolas, buscando reforçar no homem da cidade aos princípios
católicos. Tentava, dessa forma, manter influência política de forma indireta,
já que perdera o exclusivismo religioso desde o início da República. Estas
ações, contudo, atingiram profundamente somente as elites locais (o que
coadunou com os objetivos políticos da Igreja naquele momento), visto o grande
desenvolvimento na região de outras religiões, eminentemente da doutrina
espírita, a qual vai, gradativamente, ganhando força na cidade de Uberaba,
principalmente após a segunda metade do século XX.
Quanto às suas origens, Uberaba está
inserida no processo de transformações sociais, políticas e econômicas
marcantes da história do Brasil. Dessa forma, questões como o escravismo, a
imigração, o coronelismo, a religião e, principalmente, a economia pecuária
ajudam a entender a configuração regional . Este última, representada pela
criação do Zebu, tem uma relevância superior, pois foi a mola propulsora para a
verdadeira revolução urbana que ocorreu a partir dos anos de 1920 a 1940.[18] O
centro da cidade tornou-se mais condizente com o nome pelo qual Uberaba passou
a ser conhecida: capital do Zebu. Houve melhoramentos no aspecto urbano, como
calçamento, abertura de avenidas combinando com os suntuosos casarões em estilo
europeu, os quais vinham sendo construídos desde os primeiros anos do século
XX.
No período que vai dos anos 1920 até o final da Segunda Guerra Mundial há
uma enorme projeção econômica da atividade pecuária, especificamente aquela
voltada para a criação do gado Zebu. O Brasil se tornava um dos grandes produtores de carne e Uberaba era um dos seus centros de criação e distribuição. Com
o final da Guerra, houve uma crise na pecuária nacional que levou os criadores do Triângulo Mineiro a bancarrota, impulsionada pela
reestruturação econômica europeia, retomada de suas atividades
agropecuárias e, principalmente, ao fato dos empréstimos liberados pelos bancos estatais para compra de gado com valor genético agregado, passaram a ser fixados pelo governo ao valor do peso da arroba. Era a política do "Vale quanto pesa". Existe uma hipótese, levantada por alguns dos que viveram aquele
período, de que a crise da pecuária, após um momento de tanto resplendor, levou
alguns pecuaristas a moverem parte de seu capital financeiro para outras
atividades, muitas delas fora da cidade. Nos anos de 1950, o governo brasileiro
promove um reajustamento agropecuário, o qual possibilitou a retomada de parte
da importância da pecuária na região.
Uberaba, desde o início de século XX, representava um importante ponto de
desenvolvimento do interior. Com isso, a luz elétrica foi pioneira no sertão,
aqui chegando em 1905, com a inauguração da primeira usina de Monjolo, que
aproveita a força motriz da cachoeira. Durante muito tempo, esta foi a única
fonte de abastecimento elétrico da cidade – monopolizada pela empresa privada
Força e Luz. No início dos anos 1940, o abastecimento, que já não era suficiente,
estava cada vez mais precário, a exemplo da Indústria Têxtil do Cassu que
consumia quase metade de toda a energia destinada a cidade. Este fator, de
certa forma impedia o desenvolvimento de outras atividades industriais em
Uberaba.
Nesta década, foi criada a usina de Pai Joaquim, no Rio Araguari, a
qual seria uma nova opção para Uberaba, porém, com o desenvolvimento de outros municípios na
região desviou muita dessa energia para aqueles locais, possibilitando um amplo desenvolvimento econômico da região do Triângulo Mineiro a partir dos anos de 1960.
1] Esse nome, Uberaba Falsa, deve-se ao fato de situar-se próximo ao rio que era confundido com aquele que seria o verdadeiro rio Uberaba, situado mais ao norte.
[2] Como eram conhecidos os imigrantes provenientes das zonas auríferas da província de Minas Gerais.
[3] LOURENÇO, L. A. B. A oeste das Minas: escravos, índios e homens livres numa fronteira oitocentista. Triângulo Mineiro (1750-1860). Uberlândia: EdUFU, 2003. p. 86.
[4] PONTES, Hildebrando. História de Uberaba e a civilização do Brasil Central. Uberaba: Academia de Letras do Triângulo Mineiro, 1970.
[5] Segundo informativo do Arquivo Público de Uberaba, esta fazenda se localizava onde hoje se encontra a Fazenda Experimental da EPAMIG (Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais), próxima da Univerdecidade.
[6] No local hoje conhecido como Praça Rui Barbosa, centro de Uberaba, especificamente onde se encontra o Hotel Chaves.
[7] SAINT-HILAIRE, Auguste. Viagem a Província de Goiás. Belo Horizonte: Itatiaia, 1975, p. 128.
[9] LOPES,
M.A.B. Fazendas de criação do Triângulo
Mineiro. Uberaba: Museu do Zebu, 1987. Apud. COROGRÁFIA HISTÓRICA DA
PROVÍNCIA DE MINAS GERAIS, vol. 1 p.211.
[10] RESENDE,
Eliane M. M. de. Uberaba: uma
trajetória sócio-econômica, 1811-1910. Uberaba: Arquivo Público de Uberaba,
1991.
[11] Idem,
ibidem, p. 30.
[12]
MANZAN, M. Org. Fontes Primárias para a Imigração: Triângulo Mineiro e
Alto Paranaíba: Fundação cultural, 1995. p. 52.
[13]
CAPRI, R. Uberaba: a princesa do Sertão. São Paulo: Capri, Andrade &
C. Editores, 1916. p. 75-76.
[14]
PONTES, H. História de Uberaba e a Civilização no Brasil Central.
Uberaba: Academia de Letras do Triângulo Mineiro, 1970. p. 93.
[15] NABUT, J.A. Coisas que me contaram:
crônicas que escrevi. Uberaba: Vitória, 1985.
p. 81 - 92.
[16] RESENDE,
op. cit., p. 85 et. seq.
[17] LEAL, V. N. Coronelismo, enxada e voto.
3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997. p. 42.
[18]
CAPRI, op.cit., p. 42-44, nota 5.
[19] Cf.
LOPES, Maria Antonieta Borges, REZENDE, Eliane M. Márquez de. ABCZ: História e Histórias. São Paulo:
Comdesenho Estúdio e Editora, 2001.
* Thiago Riccioppo - Mestre em História pela Universidade Federal de Uberlândia - UFU, historiador da Superintendência do Arquivo Público de Uberaba e Gerente Executivo da Fundação Museu do Zebu Edilson Lamartine Mendes.
*Marcelo de Souza Silva - Doutor em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ e professor na Universidade Federal do Triângulo Mineiro - UFTM.
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