A Poesia em Uberaba
Guido
Bilharinho
A poesia, tal como é entendida,
praticada e geralmente aceita, foi o gênero literário mais cultivado em
Uberaba, rivalizando com a música e as artes plásticas. Contam-se às dezenas os compositores,
os pintores e escultores. Também os poetas.
Classicismo
A começar por vigário Silva, padre
Zeferino e João Joaquim da Silva Guimarães, pai de Bernardo Guimarães. Todos
chegados à cidade nos anos de 1820. Além deles, a cultivou em Uberaba na década
de 1850, quando aqui exerceu o ministério sacerdotal, o padre Manuel Joaquim da
Silva Guimarães, irmão de Bernardo Guimarães.
Romantismo
e Impressionismo
Posteriormente, no decorrer da segunda
metade do século XIX e até 1910, a fundação de estabelecimentos de ensino
secundário iniciada em 1854 pelo engenheiro Fernando Vaz de Melo até culminar
com a Escola Normal Oficial (1882), Colégio N. S. das Dores (1885), Instituto
Zootécnico de Uberaba (1895), Ginásio Marista Diocesano (1903) e o surgimento
da imprensa a partir de 1874 por iniciativa de Henrique Raimundo des Genettes,
criando espaço para as manifestações culturais e propiciando a formação dos
amplos quadros do magistério e do jornalismo, cresceu muito o número de poetas,
com o exemplo mais notável da vinda e estada em Uberaba por vários anos para
lecionar na Escola Normal do romancista e poeta Artur Lobo.
O historiador e polígrafo Hildebrando
Pontes, em sua “História de Uberaba”, cita, entre os poetas desse período,
Antônio Cesário da Silva e Oliveira Filho (o major Cesário, também historiador,
jurista, jornalista e compositor), J. Gaspar da Silva (posteriormente, em
Portugal, visconde de São Boaventura), José Augusto de Paiva Teixeira (Casusa,
ainda jornalista e político), Aurélio de Araújo Vaz de Melo (também
romancista), Elviro de Novais, Garibaldi de Carvalho Melo, Otávio Augusto de
Paiva Teixeira (filho de Casusa e pai do geólogo Glycon de Paiva) e Lourival
Balduíno do Carmo, autor, em 1918, da letra da “Marcha do Uberaba Sport”,
composta por Rigoletto de Martino, autor, este, de mais de 200 (duzentas)
composições musicais em nada menos de 17 (dezessete) diferentes gêneros.
Afora eles, ainda são encontrados na
cidade, além de outros, como poetas nela residentes, Egídio Andrade, Arlindo
Costa e Silva, Manuel Filipe de Sousa, Atanásio Saltão e Felício Buarque, este,
autor de Folhas Soltas (1906), primeiro livro de poemas aqui editado,
além de autor - antes de vir para Uberaba, onde atuou simultaneamente como
promotor e advogado, o que era possível à época - do primeiro livro em defesa
da então novel República, Origens Republicanas (1894) e, ainda, de
livros jurídicos, sendo presidente do Grêmio Literário Bernardo Guimarães e
redator da notável “Revista de Uberaba”, editada mensalmente de março/1904 a
fevereiro/1905.
Parnasianismo
Já nas décadas de 1910 e 1920, como
ocorreu com o teatro, tanto em termos de elaboração dramatúrgica quanto de
organização e atividades de grupos teatrais, desconhece-se a existência de
edição de livros de poesia até a publicação, nos anos finais desse período, dos
livros de poemas “Luz e Sombra”, de Pedro Conti, e “Névoa”, de Lauro Fontoura.
Nesse período predominou a influência
da sonetização parnasiana de Bilac, Raimundo Correia e Alberto de Oliveira.
Ainda na década de 1920 ocorreu a divulgação do modernismo por meio de artigos
dos médicos Paulo Rosa e Boulanger Pucci com base no movimento modernista
eclodido em São Paulo em fevereiro de 1922.
Modernismo
A partir daí começaram a pontificar os
poemas prosificados modernistas principalmente de Paulo Rosa, Quintiliano
Jardim e Gabriel Toti, publicados na imprensa e nos livros “Nilza” (1935), de
Ataíde Martins, e “Oração dos Humildes” (1940), de Santino Gomes de Matos.
Na década de 1940 ocorreu a estreia
poética, no mesmo diapasão modernista, de Válter Campos de Carvalho nas páginas
de “Lavoura e Comércio”.
Nos anos da década de 1950 foram
publicados os livros “Procissão de Encontros” (1950), de Santino Gomes de
Matos; “Canto Que Amanhece”(1955), de Moacir Laterza; “Páginas da Vida” (s/d),
de Mauro Morais e Castro; “Fuga”, de Angélica Milena Riccioppo, ainda dentro
dos amplos parâmetros modernistas; e “Fiandeira” (1951), trovas de Eva Reis.
Nas décadas de 1960 e seguintes, vários
poetas de dicção modernista publicaram livros, entre eles, Geraldo Miguel (“Alvorecer
Sem Paz”, s/d); Santino Gomes de Matos (“Céu Deposto” 1962); Dione de Resende
(“Semente Enferma”, 1963); Justino Mendes (monsenhor José João Perna, “Lira das
Selvas”, 1967); Luís Manuel da Costa Filho (“Poemas em Contrastes”,1979);
Eunice Sousa Lima Pühler (“As mil e Uma Ruas Por Onde Andou Minha Infância”,
1983); Heli Maia (“Negativos”, 1987; “Cromos, 1990; Poemas de Aluvião”, 1993);
Carlos Peres (“Tríplices Cordas do Destino”, 1996); e Consuelo Resende (“Em
Tempos”, 1996).
No Rio de Janeiro, nesse período, o
uberabense Cacaso (Antônio Carlos de Brito) lançou “A Palavra Cerzida” (1967)
ainda modernista, “Mar de Mineiro” (1982, nos parâmetros do movimento marginal)
e “Beijo na Boca” (1985), entre outras obras.
Nos anos 80 ainda ocorreu o lançamento
póstumo de obras de Lauro Fontoura (“Ciclo do Amor e da Vida”, 1980) e de Lúcio
Mendonça (“Nas Asas do Sonho” e “Evangelho de Um Triste”, 1982).
Nos anos 2000, ainda dentro das
reminiscências modernistas, lançaram livros, entre outros, André Amui, André
del Negri, irmã Domitila Ribeiro Borges, Hélio José Destro, Júlio Bernardo,
Edmundo de Freitas, Ubirajara Franco e Rafaela Ferreira Miziara, entre outros.
O GRUPO
DE UBERABA
Fora da linhagem poética até então
predominante e já superando a estética modernista, constituiu-se, a partir dos
fins dos anos de 1960, grupo de poetas que perfilhou tendências totalmente
diversas e que vincou as décadas seguintes, imprimindo-lhes o sainete da
vanguarda, do neobarroco e do construtivismo poético.
Esse grupo pontificou no “Suplemento
Cultural do Correio Católico” (julho/1968 a julho/1972), na revista
“Convergência”, da ALTM, de 1972 a 1976, na revista de poesia “Dimensão” (1980
a 2000), projetando-se na antologia “A Poesia em Uberaba: Do Modernismo à
Vanguarda” (2003).
A
VANGUARDA DOS ANOS 60/70
Materializou-se
nos poemas de Jorge Alberto Nabut e Xico Chaves (Francisco Assis Chaves
Bastos), com quebra dos padrões poéticos anteriores e criação de novas
propostas poéticas, verbi-espaciais e alta dose de invenção e criatividade.
O
NEOBARROCO DO ANOS 70
O barroco distingue-se do classicismo
tanto por diferenças estilísticas, que compõem sua face visível, quanto por
diversa visão e sentimento do mundo.
A poesia desenvolvida por Jorge Alberto
Nabut após sua fase experimental e vanguardista inicial, apresentou etapa
transicional com simultaneidade de elementos estéticos experimentais e neobarrocos na obra-prima “Branco em Fundo
Ocre: Desemboque”, incidindo em dicção verbalizada, porém, balizada por
discursividade vigorosa, sofisticada e trabalhada em cortes substantivos.
CONSTRUTIVISMO
POÉTICO
DAS
DÉCADAS DE 80 E 90
O construtivismo poético é, antes que
tendência, método de apropriação e submissão da subjetividade a disciplinamento
racional propiciador e estimulador do exercício da sensibilidade,
manifestando-se mediante prática elaborativa e reelaborativa do fazer poético,
exigindo a convocação simultânea de esforço, atenção, consciência e informação
estética.
Razão e sensibilidade balizam e
direcionam a ação criativa, domando e expungindo os apelos e as facilidades da
subjetividade, do emocionalismo e da sentimentalidade, responsáveis por impor
(e expor), em geral, idiossincrasias, devaneios inconsequentes e limitações
intelectuais.
Essa tendência inaugurou-se em Uberaba
com o livro “Tempesfera” (1979), de Teresinha Hueb de Meneses, ampliando-se na
esteira da atualização estética procedida pela revista “Dimensão”, desaguando
na produção poética de Carlos Roberto Lacerda (“Astérion”, 1983; “O Azul Menos
o Nome”, 1991), Olívio Tomaim Neto, Maria Aparecida Vilhena do Reis (anterior
Lisboa), Hugo Maciel de Carvalho e Guido Bilharinho (“Aspectos”, 1992;
“Espécies”, 2005), permanecendo inéditos em livros os demais, mas com destacada
presença nas páginas de “Dimensão” (1980-2000) e no ensaio-antologia “A Poesia
em Uberaba: Do Modernismo à Vanguarda” (2003).
A
VANGUARDA DOS ANOS 90
Num fenômeno raro na produção poética
na década epigrafada, Uberaba apresentou grupo de poetas de vanguarda, com
obras derivadas do pleno exercício da liberdade criadora e da inventividade
artística, de autonomia de concepção, de livre articulação mental e execução de
procedimentos não enquadrados nem subordináveis à fórmulas e cânones
estabelecidos, na produção poética verbalizada de José Humberto Henriques, Tony
Gray Cavalheiro, Juliano Balogna, Marcos Bilharinho e André Luís Fernandes da
Silva, todos integrando também o livro “A Poesia em Uberaba: Do Modernismo à
Vanguarda”.
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Guido Bilharinho é advogado em Uberaba e
autor de livros de literatura, cinema, estudos brasileiros, História do Brasil
e regional editados em papel e, desde setembro/2017, um livro por mês no blog
https://guidobilharinho.blogspot.com.br/
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