O Príncipe
“Aquele que engana sempre encontrará alguém
que se deixa enganar.” (Maquiavel)
Maquiavel é autor de diversos ensaios, peças de teatros e obras filosóficas.
O Príncipe se tornou o mais
importante ensaio de política, sendo amplamente estudado e debatido em universidades,
em cursos de Ciências Políticas, Filosofia e História. Contudo, seguramente essa
não era a sua preocupação, pois seu único objetivo era conseguir as graças do monarca Lourenço de Médici.
Contextualização histórica
No começo do século XVI, a Itália,
berço do Renascimento, onde nasceu Maquiavel, não era um país unificado, como
hoje. Havia na região uma dezena de pequenos reinados, ducados, condados,
principados e repúblicas. Por isso a instabilidade era constante, com disputas
territoriais, disputas pelo poder e muito derramamento de sangue.
Diante desse quadro, os governantes, em
geral, não conseguiam se manter muito tempo no poder. Eles morriam em batalhas
ou assassinados, sendo o envenenamento uma prática muito comum.
Mapa da Itália em 1494 |
Até o ano de 1527, Florença era governada por um sistema republicano oligárquico, onde comerciantes milionários decidiam o futuro político da cidade. Naquela época, Nicolau Maquiavel era funcionário do governo de Florença e exerceu durante 14 anos o cargo de diplomata. Com isso, tornou-se um ardoroso defensor da República no governo lhe garantia emprego. Para ele, a República era o sistema de governo mais justo e eficiente (LUBRANO).
Infelizmente, para
Maquiavel era um período de efervescência política e a república florentina
estava vivendo seus últimos dias. Em 1512, os Médicis foram expulsos de
Florença. Família muito tradicional e de passado ligado à política e ao governo,
seus integrantes não se deram por satisfeitos e organizaram um contra-ataque.
Os Médicis não
aceitavam a forma de governo republicano, pois tinham como objetivo instalar um
sistema no qual pudessem concentrar todo o poder em suas mãos, ou seja, queriam
a Monarquia em Florença.
Uma das formas dos
Médicis, de avançar sobre a região, foi manipular a eleição do papado em Roma,
que naquela época mantinha um poder e um Exército superior a de muitos países. Conseguiram
eleger o papa Giovanni de Médici, membro da família, que se tornou o papa Leão
X.
Apesar de ser
considerado um mecenas, que apoiava o desenvolvimento do pensamento filosófico
e as artes, o papa Leão X tinha um lado obscuro: era líder militar e tinha ambições
pessoais e disputas pelo poder. Através de tenebroso derramamento de sangue,
Leão X foi o responsável por reintroduzir sua família no poder de Florença. Em
1553 os Médicis voltavam a Florença, destruíram a República e instalaram a
Monarquia, colocando Lourenço de Mécidi no governo da cidade.
Maquiavel
não escapou. Como ele trabalhou durante muito tempo para o derrotado governo
republicano, foi preso e torturado. Milagrosamente não morreu e acabou sendo
exilado para uma pequena propriedade rural de sua família, longe da agitação da
renascentista Florença.
Com
isso, Maquiavel teve que se afastar da vida política. Nas diversas cartas
escritas a amigos e parentes, relatava o tédio e a angústia da vida no campo.
Ele dizia que faria qualquer coisa para recuperar suas atividades políticas,
pois se sentia um político verdadeiro.
Nicolau
Maquiavel fez o que achou que deveria fazer: elogiar o novo príncipe para
tentar reaver o seu emprego. Deixou as ideias republicanas e passou a escrever
o que se tornaria sua obra mais conhecida: O
Príncipe. Nesse trabalho Maquiavel demonstrou que tinha muito a contribuir
para que o príncipe se mantivesse no poder. Ele colocou no papel todos os
truques e estratégias que o governo tinha que observar, pois naquele tempo o
reinado de um príncipe durava pouco tempo e geralmente terminava em
conspirações (LUBRANO).
Ele morreu antes de seu livro ser editado. Enquanto escrevia, certamente não
previa a direção que essa obra tomaria.
O livro
Movido pelo desespero, o resultado foi
um trabalho como nunca tinha sido feito antes. Pela primeira vez um livro
abordava a política como era no mundo real e não como deveria ser no mundo
ideal. Escrevendo como deveria ser a vida de um príncipe, descortinou a
realidade e as mazelas do poder:
Sendo minha intenção
escrever coisas que são úteis a quem se interesse, é mais conveniente ir direto
na verdade efetiva das coisas. Não foram poucos os que imaginavam republica e
principados como nunca na realidade (...)
O homem que quiser
ser bom em todos os aspectos, terminará arruinado entre tantos que não são
bons. É preciso que o Príncipe aprenda, caso queira manter-se no poder, a não
ser bom e valer-se disso de acordo com a necessidade. (Cap. XV. O Príncipe)
Maquiavel
considerava que o príncipe iria causar desgraça ainda maior se fosse
excessivamente bom, porque a política é volátil. Argumentava que às vezes não é
possível honrar a palavra dada e ele deveria cometer alguns atos de crueldade
(LUBRANO).
Para ele,
um príncipe deveria demonstrar as seguintes qualidades: piedade, fidelidade, humanidade,
religiosidade e integridade. No entanto, não precisaria possuir nenhuma delas,
mas deveria convencer as pessoas de que ele as possuía. Maquiavel chegou a
dizer que possuí-las poderia ser um empecilho para a realização de um bom
governo (LUBRANO).
Maquiavel,
em seu livro, nos deu as ferramentas para conhecermos o pensamento e articulações
palacianas, muito comuns nos governos do seu tempo, na Europa do século XVI.
O livro
serve para que as pessoas se orientem politicamente, evitando comportamentos
duvidosos na vida pública, seja através de participação popular e consciente,
seja se articulando para engendrarem nova realidade política que supere
artimanhas do poder, sem se deixarem enganar.
Maquiavel
afirmou que:
Os homens
são tão simplórios e tão obedientes às necessidades imediatas, pois aquele que
engana sempre encontrará alguém que se deixa enganar.
Muitas
pessoas o consideram um manual e um compêndio que ensina as pessoas a arte de
gerir e de administrar. Por isso, afirmam que é um livro de cabeceira, o qual
deveriam consultar diuturnamente. Contudo, Maquiavel escreveu O Príncipe no começo do século XVI, para
as pessoas de sua época, com os problemas evidenciados naquele tempo. O mundo
mudou e em vários países europeus atualmente há a completa rejeição por essa postura
política.
Entretanto,
no Brasil ainda hoje muitos governantes mantém práticas semelhantes ao
comportamento do príncipe descrito por Maquiavel, mesmo estando limitados pela
Constituição.
Texto
baseado na resenha feita pela jornalista Isabella Lubrano, no canal “Ler antes de morrer”
Livro:
MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. Porto
Alegre: L&PM, 2008.
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